Carros de som com músicas ridículas berram nas ruas. Bandeiras se agitam, qual em torcidas de futebol. Panfletos são distribuídos exaustivamente nas ruas. Parece carnaval, “essa ofegante epidemia”. Mas é só a campanha eleitoral. Milhares de cartazes, outdoors e “santinhos” poluem as cidades, e todos me parecem iguais: uma sigla, um número, uma frase idiota e um rosto, sempre sorridente. Está aberta a temporada dos filhos-da-puta sorridentes.
Sempre os mesmos cartazes, os rostos podem ser diferentes, mas no fundo parecem ser de uma única pessoa. Sempre sorrindo, parecendo muito satisfeitos com o que estão vendo. E fazendo uma grande festa, com sua música de campanha, bandeiras, e o séqüito de infelizes homens-sanduíches, que sempre parecem cansados ou envergonhados, ao contrário das fotos sorridentes. Parece que o circo chegou, mas se são eles que estão rindo, é porque os palhaços somos nós. Os palhaços somos nós.
O sorriso do candidato parece zombar do povo, que não importa o que faça vai acabar tendo que escolher um deles. O sorriso é um escárnio, pois você será obrigado a ir às urnas escolher o menos pior. Que uma vez eleito, se tornará muito, mas muito pior. Eles têm o rosto despreocupado e feliz, satisfeitos consigo mesmo, já antevendo a oportunidade de administrar o dinheiro público - e de preferência em benefício próprio. Uma coisa todos têm em comum: estão sempre rindo. Até naqueles que parecem mais sérios, dá para perceber lá no fundo um sorriso sardônico. Talvez esses sejam os piores.
Eu poderia até votar em alguém apenas por aparecer sério na foto da campanha. Mas não apenas sério; não, o meu candidato deveria ter os olhos tristes, tristes por causa dos mortos em deslizamentos de terra, tristes com a violência doméstica contra tantas crianças e mulheres. Sua fronte deveria estar enrugada, preocupado com a saúde pública no Brasil, de profissionais sobrecarregados e mal-remunerados, e sem condições e material para trabalhar. Preocupado com o ensino público, com as crianças que seriam nosso futuro crescendo sem o estudo que as capacitaria a tornarem esse país melhor, seus potenciais desperdiçados para sempre. E a boca do candidato não deveria ostentar sorrisos fúteis, mas sim trazer os dentes cerrados e os lábios comprimidos, com verdadeira ira contra a corrupção generalizada, a desmoralização das instituições, a total falta de moral e ética dos homens públicos que aí estão.
Mas o que eu vejo são só sorrisos, dos deputados que tentam continuar, voltar ou chegar ao poder, do governador que tenta se reeleger, do presidente que tenta eleger sua sucessora, felizes com o Brasil perfeito que eles criaram. Mas criaram esse Brasil perfeito só para eles, que viajam e comem e consomem o dinheiro dos nossos impostos, nós que trabalhamos para sustentá-los e não temos nada em troca, e assistimos esse carnaval político sem dizer nada. E o povo segue feliz, aproveitando o carnaval para pedir favores políticos, aproveitando as obras de curta duração e os subempregos temporários de homens-sanduíche e porta-estandartes, contentes com a sua última compra a prazo com juros altíssimos no carnê das Casas Bahia.
Fico profundamente triste com tudo isso. Mas eles, eles não. Para eles a vida é essa festa, esse gasto desenfreado com material de campanha que polui o ambiente, estraga a paisagem, fere os ouvidos e entope os bueiros. O dinheiro empregado em campanha dará fartos lucros, assim que chegarem ao poder e colocarem suas mãos sujas no erário público, com negociações escusas e “tenebrosas transações”. Realmente, eles têm razões para rir. Eu não.
Está aberta a Temporada dos Filhos-da-puta Sorridentes.
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